Jogos e a Violência

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Como amante de jogos e indivíduo equilibrado, afirmo de antemão que jogos não estimulam a violência. Existem inúmeros estudos que comprovam isto.

Como pesquisador e cidadão, afirmo que a violência em jogos pode influenciar atitudes agressivas. Existem inúmeros estudos que comprovam isto.

Ou seja, a princípio, as pesquisas demonstram que há pessoas que são influenciadas negativamente pelos jogos, mas diversas outras que não são. O que se pode concluir a partir disto?

Nada.

Isso mesmo. Nada, porque há credibilidade em todos os estudos, ao mesmo tempo em que também há limitações, sejam territoriais, sociais ou de amostragem. Isto me faz questionar qualquer conclusão, pois se temos uma comprovação contrária, não podemos afirmar com certeza que jogos possuem este poder do mal ou do bem (ou neutro).

Desta forma, para tratar do tema, decidi assumir duas personalidades (o que contradiz o fato de eu ser equilibrado): uma que acredita na relação entre violência e jogos e outra que não.

Games, coisa do demo

Jogos são formados por cenas e ações violentas, como matar, roubar, pisotear, chutar, espancar, esfaquear, triturar, atropelar, socar, afogar… A quantidade de brutalidade banaliza a própria violência, pois a torna corriqueira. Isto é visto também nos jornais: muitas vezes, não nos espantamos com notícias de atrocidades como deveríamos porque a maior parte das reportagens é formada com este teor negativo.

O corpo humano se adéqua às situações que experimenta. Da mesma forma que nossos olhos se adaptam a um ambiente escuro depois de um tempo, nossa mente acaba se acostumando com a violência. Em uma ocasião, uma mãe, moradora de uma favela, me contou que seu filho de 4 anos já se escondia embaixo da mesa quando ouvia tiros – e ele fazia isso naturalmente na creche, sozinho e sem chorar. Este garoto crescerá acreditando que tiroteio e, consequentemente, o uso de armas são habituais na sociedade; ele não se espantará ao ver alguém armado.A agressividade existe em todas as pessoas, em maior ou menor grau, e jogos violentos podem estimular este lado. Uma mente fraca ou em formação (como crianças e adolescentes) sofre influência daquilo que experimenta. Seu caráter é moldado a partir do que vê, ouve ou faz. Desta forma, qualquer obra cultural é capaz de auxiliar na formação de personalidades agressivas. No caso dos videogames, participar é mais que assistir. Age-se violentamente em games, diferente do que ocorre em filmes e livros, mídias consideradas mais passivas. Nestes, o indivíduo testemunha a violência; naqueles, ele é responsável pelas suas ações.

Quanto mais violência estiver envolvida, mais ela será considerada natural, levando-nos a julgar atitudes violentas como apropriadas e esperadas. Por este lado, jogos estimulam o comportamento violento, pois dependem dele na sua formação (gameplay) e banalizam-no.

Games, apenas entretenimento

Jogos são mais uma expressão cultural (mesmo que nossa Ministra não entenda desta forma). Portanto, culpá-los por atos violentos é a mesma coisa que culpar o próprio entretenimento, a própria cultura. Filmes, livros, quadrinhos, peças, shows, tudo deveria ser questionado neste quesito. E não são por quê? Simples, porque todos (ou quase todos) entendem que são obras ficcionais independentes da psique humana. Não há ligação de causa e efeito entre eles e a violência. Ver um filme de terror não gera assassinatos por desmembramento.

Uma corrente de pensamento acredita que o instinto agressivo está na formação do indivíduo. Então, é preciso trabalhá-lo de alguma forma. Os jogos, assim, podem assumir uma ferramenta de catarse. A violência dentro de cada um é liberada no jogo ao invés de na sociedade.Particularmente, acredito que esta agressividade é uma ferramenta para um desejo mais profundo: a competição; a busca por superação, evolução, dominação, vitória, maestria. Jogar, assim, permite a satisfação, logo, um relaxamento de tensão. E alguém calmo não pode ser violento…

Pontuar uma causa para a violência chega a ser infantil. A violência é um sistema complexo e para entendê-la é necessário averiguar uma série de variáveis, tanto individuais quanto coletivas: idade, sexo, condição social, sociabilidade, biografia, criação; ambiente particular, contexto social, contexto cultural, pessoas influentes etc. Um ato agressivo pode ter um estopim, mas é o resultado de um conjunto de elementos: sofrer bullying, assistir a filmes de terror, apanhar dos pais, perder o emprego, ter dificuldade de se relacionar, estar insatisfeito com o próprio corpo, ter doenças, morar em um bairro violento, acompanhar notícias violentas, presenciar atos agressivos, ter problemas mentais entre milhares de outros.

Dentro de um universo destes, é inconcebível acreditar que um grupo de adolescentes apresentou características violentas porque passou horas jogando Battlefield 3. Para mim, isto teria valor caso estes adolescentes tivessem sido criados em bolhas durante toda a vida e nunca tivessem cometido atos violentos. Só assim, chutar um cachorro poderia ser resultado das horas jogando o FPS (first person shooter).

Por este lado, jogos não estimulam o comportamento violento, pois a violência é o resultado da interação entre a personalidade individual, biografia pessoal e o contexto social/cultural.

Tá, e daí?

Jogos podem estimular a violência, mas apenas em pessoas predispostas ou em mentes se formando – e, mesmo nestes casos, não é certo, pois a exteriorização de atos agressivos ainda dependerá da influência de outros agentes externos, além de um grande período de exposição (eu diria anos, mas seria um chute…).

Qualquer afirmação categórica deve ser questionada, tanto para o bem quanto para o mal. Nada é 100% garantido e o fato de um argumento considerar-se desta forma já diminui automaticamente sua credibilidade. Entretanto, acredito que o debate em questão nunca realmente irá para frente, pois não é do interesse do mercado. Não que o tema não seja importante, mas a indústria de games movimenta bilhões e é mais fácil esquecer o assunto do que valorizá-lo, “perde-se tempo” levando-o em consideração. No fim, qualquer conclusão será ignorada, seja ela positiva ou negativa.

Não sei se fico feliz ou triste…

Gustavo Audi

Se fosse uma entrevista de emprego, diria: inteligente, esforçado e cujo maior defeito é cobrar demais de si mesmo... Como não é, digo apenas que sou apaixonado por jogos, histórias e cultura nerd.

Este post tem 2 comentários

  1. Renver

    Sempre é a culpa dos games né!!

    Nunca é a culpa da família mau estruturada do cabra.

    1. Gustavo Audi

      As pessoas gostam de culpar aquilo que não compreendem.

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