Voto nulo pra quem?

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Uma das “verdades” que circulam de mesas de bar a simpósios acadêmicos Brasil afora é a de que “não existe mais direita e esquerda no país”, geralmente acrescido por, “isso se alguma vez houve”. Obviamente, o uso das aspas no termo verdades se dá por eu não concordar com elas. Muita gente que considero inteligente, e cuja opinião respeito (e os dois não necessariamente estão juntos), já proferiu essa sentença, seja em conversas informais, colunas de jornal ou debates políticos. Há certa verdade nelas, sem dúvidas, mas isso não valida seu uso irrestrito e, sobretudo, sua apropriação pelo outro lado da questão – pessoas igualmente inteligentes, mas cuja opinião não respeito.

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Minha discordância se direciona especialmente aos colegas das Ciências Humanas e Sociais, sociólogos, cientistas políticos, historiadores, filósofos, psicólogos, advogados, artistas, economistas, e outros membros da intelligentsia (geralmente, mas não necessariamente, “de esquerda”) das mais diversas áreas do conhecimento, que se valem dessa prerrogativa. Ela está centrada no fato de esses ilustres colegas pegarem um conhecido fato histórico, político e científico – a despolarização do chamado “mundo livre” com o fim da disputa entre comunismo e capitalismo pela supremacia global, que tem como marco de facto a queda do Muro de Berlim e a dissolução da URSS, mas que poderia tão facilmente ter seu fim no “governo” de Stalin quando o projeto comunista falhou aparentemente de maneira irremediável –, e não se preocuparem com a forma com que ele é enunciado ou como chega ao público.

Até porque qualquer pessoa que se sente num bar em qualquer cidade do Brasil ou ainda converse na fila do supermercado, ou do banco, em suma, preste atenção ao que se diz nas ruas, vai ver que ainda se usa BASTANTE o termo “comunista” como forma direta de insulto ou pejorativamente atrelada ao novo termo “esquerdista”. Isso bem antes do infame ~~filósofo~~ Olavo de Carvalho pensar em criar uma conta no Youtube. Então, embora “não haja” direita e esquerda nos livros didáticos, nas casas legislativas e no Palácio do Planalto, a questão ainda está bem viva por aí a fora.

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Além do mais, ser “de esquerda” ou defender ideais de esquerda não significa defender a implatação de um governo socialista com confisco imediato de bens e redistribuição da riqueza (embora, na minha opinião, já está mais do que na hora disso rolar para latifundiários do Centro-Oeste e grandes industriais e oligarcas do Sudeste). Ser de esquerda, hoje, eu diria, é acreditar na justiça social, na intervenção do Estado pra redução da desigualdade, que os direitos do cidadão estão acima do lucro das empresas.

Por sua vez, pra mim, pessoalmente e como Jornalista/pesquisador de Comunicação, é impressionante ver como as pessoas que estão tão preocupadas em denunciar a ~~manipulação~~ dos meios de comunicação, sobretudo, das Organizações Globo, dão também muito pouco crédito à população do país em que vivem. Digo impressionante, mas não surpreendente, até porque as duas ideias estão interligadas. Ainda não entendi bem se essa é uma questão epistemológica que vem da constituição desses outros saberes, ou só um resquício na Academia do tal complexo de vira-latas do qual Nelson Rodrigues falava. Claro, mesclado à genial premissa sartreana do “O inferno são os outros”.

Então, quando a gente diz que “eles, o povo brasileiro (os outros), não sabe votar” (isso quando essa maioria dissidente simplesmente discorda da gente, os iluminados, os que supostamente sabem votar) ou quando reduzimos nossa própria impotência em relação ao “pensamento coletivo” (intelectualmente, me recuso a usar a palavra massa), com expressões vazias e profundamente elitistas como, “pão e circo”. No fundo, a gente é que queria poder “manipular” a opinião pública a nosso favor (pra nossa ideologia, pro nosso candidato, pra nossa agenda), mas como não conseguimos, creditamos isso não à nossa incompetência retórica, mas à ~~alienação~~ deles, do “povo brasileiro”. “O brasileiro não sabe votar (menos eu, eu sei)”. Novamente. “O inferno são os outros”.

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Vou explicar porque digo que o pessoal de Comunicação pensa (ou deveria pensar) diferente. Com certo orgulho, devo dizer que a gente de Comunicação (e outras áreas com pensamento parecido) se dá tão bem em “manipular” esse “povo”, essa “massa”, justamente porque a gente, pelo menos boa parte, não subestima esse “pessoal”. Não consideramos nosso espectador, nosso leitor, nosso público-ALVO como massa de manobra que está ali à nossa disposição. Muito pelo contrário. Independente do curso (Jornalismo, Cinema, Publicidade, Relações Públicas etc.), na primeira aula numa faculdade de Comunicação, pelo menos nas boas faculdades, a gente aprende que, em primeiro lugar, não existe “povo”, essa massa uniforme de indivíduos que pensa igual e faz tudo igual, e, em segundo, que eles, o seu público/audiência, são nossos adversários/oponentes mais ferrenhos, implacáveis até, eu diria. E nós temos que LUTAR por sua atenção! E usando nossos MELHORES RECURSOS!

Os marketeiros, os publicitários e os managers de diversas ordens e setores que trabalham pro “outro lado”, falando politicamente, os conversadores e a direita (não são necessariamente os mesmos), e economicamente, os 1% da pirâmide da desigualdade de renda, sabem disso. Vivem e lucram exorbitantemente com isso, inclusive.

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Como minha mãe diz quando pergunto onde estão meus livros, mangás, jogos ou bonecas da barbie. “Procura que você acha”

Sei que é dificil pra gente que “lê jornal”, que “procura se informar”, que “assiste à Globo News e lê a Veja toda a semana” (ou que assiste ao Roda Viva e lê a Piauí) considerar que minha mãe vendo a novela, minha tia que não perde um programa de fofocas ou meu pai que fervorosamente deposita seu dizimo na igreja não têm um discernimento menor do que o bolsista do Ciências Sem Fronteiras ou do professor universitário catedrático. Não subestime o seu amiguinho, colega, vizinho, tio ou primo. Você acha que ele vai ouvir o cara que o chama de burro/alienado ou aquele que fala numa linguagem que ele pode entender e se relacionar?

Em vez de estarmos preocupados em alienar as pessoas, estamos mais preocupados em reconhecer as qualidades dos demais atores e indivíduos que compõem nossas relações sociais; e é por isso que fazemos tão bem isso que ficou “chique”, “culto” chamar de manipulação.

Daí essa meia verdade do “não existir direita e esquerda no Brasil” ser tão perigosa. Porque ela é usada por gente muito inteligente, eu diria, como ferramenta de desinformação (justamente esses marketeiros, publicitários, managers whatever).  Para substanciar, confirmar, municiar, uma das maiores inverdades espalhadas pela cultura política de nossa nação, e quando digo cultura política digo desde a mentalidade do eleitorado e sua constituição cívica até as campanhas de candidatos e das políticas públicas dos eleitos, o que acaba influenciando também os setores não eleitos (Ministério Publico, Judiciário), a de que “todo político é igual”.

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Uma clara forma de misturar joio e trigo, criando uma cultura de desconfiança e baixa estima que leva até o mais fervoroso dos militantes e mais proeminentes dos intelectuais a dizer que “vai votar no menos pior”. Isso porque ele parte, sem perceber ou não, desse princípio, de que todos são iguais. E que, dentro das ramificações mais centrais do partidarismo político, não existe distinção visível (estando do lado “certo” apenas aquela facção ou núcleo minoritário a que ele pertence). Ou seja, é você, seu pseudo-intelectual que quer pagar de politizado, e não minha tia que nào perde um TV Fama, que financia esta merda!

Sim, o brasileiro, a gente, não tá acostumado à participação política direta. A gente tem pouco tempo de real democracia. E da mesma forma que esse pessoal pós-adoslecente que nasceu no começo dos anos 90, nossa democracia é meio boçal, possui tendências suicidas/autodestrutivas e é extremamente mimada. Se não for exatamente do jeito que a gente quer, então não presta. “É tudo igual”, “sou contra tudo isso que está aí”, “melhor voltar pra ditadura, lá não tinha corrupção”.

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Escolher um candidato não deve ser como escolher um companheiro(a). Você não precisa concordar com tudo o que ele diz ou faz (e nem ele com você). Aliás, nem pra escolher namorada(o) a gente faz isso. Se ela/ele for gostosinha(o) e gostar de mangá, geralmente a gente não quer nem saber qual a proposta do indivíduo pra educação, se é contra ou a favor do aborto, se passa manteiga ou nutella no pão. Então, por que nosso candidato tem que ser perfeito? Um reflexo exato dos nossos ideais?

Isso não quer dizer que a gente precisa se conformar com o primeiro que nos der um boné, fizer um churrasco ou nos arranjar um emprego (até porque isso é compra de voto). Mas que após considerar os candidatos e fazer sua escolha (espero eu, após alguma pesquisa), não diga que ele é o “menos pior”, só pra parecer descolado e/ou tirar o seu da reta caso ele venha a fazer algo reprovável depois. E, sobretudo, não saia por aí propagando essa ideia de que todo mundo tem que votar nulo “já que nada do que taí presta” só porque você não fez/não quer fazer sua pesquisa direito (até porque isso NÃO invalida o pleito http://goo.gl/sHsOVG).

Primeiro. Houverem? Segundo: Vasco. Terceiro. Não são votos nulos, são VOTOS INVÁLIDOS. Votos nulos e brancos SÃO VOTOS VÁLIDOS. (votos inválidos são votos por obtidos comprovada coação, compra, fraude etc.). Sim, eu percebo a ironia de que considerando isso, na verdade, boa parte das eleições no Brasil podem sim ser anuladas, mas não pelos votos nulos, mas pelos votos de cabresto, pela compra de votos etc. (mas aí precisa de investigação e prova)
Primeiro. Houverem? Segundo: Vasco. Terceiro. Não são votos nulos, são VOTOS INVÁLIDOS. Votos nulos e brancos SÃO VOTOS VÁLIDOS. (votos inválidos são votos obtidos por comprovada coação, compra, fraude etc.). Sim, eu percebo a ironia de que considerando isso, na verdade, boa parte das eleições no Brasil podem sim ser anuladas, mas não pelos votos nulos, mas pelos votos de cabresto, pela compra de voto, pelo boné do deputado etc. (mas aí precisa de investigação e prova)

Você tem todo o direito de anular seu voto, caso não ache um candidato que atenda às suas necessidades e demandas, mas daí a dizer que todo mundo deve fazê-lo com base nesse argumento de “todo político é igual” é subestimar não só o seu colega concidadão, mas jogar no lixo todo o avanço político que tivemos nesses últimos 20 e poucos anos (e, repito, taxar tudo como uma coisa só, apenas demonstra a sua desinformação).

Essa é só pela zuera. hauahua
Essa é só pela zuera. Juro. Nada contra quem vota nulo (você só não é revolucionário). hauahua

Particularmente, acredito que mudança se faz com ação e não com abstenção. Tanto nas eleições, quanto na vida, estou preparado pra estar errado, pra quebrar a cara, pra ser contrariado. Os amigos nerds certamente vão lembrar, “o herói que você precisa, não o herói que você quer”. Não que os políticos sejam heróis, LONGE DISSO, mas, como seu representante, ele deve agir no seu melhor interesse, e, sendo bem sincero, isso muitas vezes significa não fazer o que você quer, mas o que você precisa, mesmo que a gente não aceite (às vezes isso significa “dar dinheiro pra pobre”, “instituir cotas”, fazer ciclovia, criar uma nova moeda, aumentar os juros, distribuir igualmente entre os estados da União a riqueza de um estado, legalizar o aborto, descriminalizar a maconha, instituir o casamento civil para pessoas do mesmo sexo, e por aí vai).

E, claro, política não é só votar a cada quatro anos (ou, mais precisamente, votar intercaladamente a cada dois). É uma atividade continua, requer tempo, requer dedicação, não é só ir lá votar e acabou. O cara (ou a moça) tá fazendo besteira ou tá fazendo algo que você fundamentalmente não concorda, proteste, manifeste-se, faça-se ouvir. Democracia é isso, fazer oposição é isso (e não só se opor a tudo o que o outro faz). Mude o único chavão que ainda tem algo de verdade, “depois de eleitos, eles não estão nem aí pra você”. Pois bem, façam eles se importarem! A hora é essa!

Zé Messias

Jornalista não praticante, projeto de professor universitário, fraude e nerd em tempo integral cash advance online.

Este post tem 2 comentários

  1. Gustavo Audi

    “Ser de esquerda, hoje, eu diria, é acreditar na justiça social, na intervenção do Estado pra redução da desigualdade, que os direitos do cidadão estão acima do lucro das empresas.”

    O que é ser “de esquerda” antigamente?

    1. Don Vittor

      Depende, se for para o governo é isso tudo, mas com honestidade. E, se for para a população com um plus de empatia rs

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