Ponta de Estoque: I Am Alive

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Sempre tem gente fazendo cobertura de novos games, porém, ninguém se lembra daqueles que não têm dinheiro pra ficar comprando lançamentos, mas também querem ter seus joguinhos. Esse é o objetivo básico dessa coluna: ajudar a orientar as pessoas que querem ter jogos sem gastar tanto, e não se importam que sejam mais antigos. Além disso, também é uma desculpa barata pra cagar regra em cima de jogos antigos que ainda são vendidos em promoção pelos camelódromos e infocenters da vida.

O jogo de hoje será I Am Alive; lançado em 2012. Este é mais um dos já inúmeros games que resolvem centrar sua narrativa num futuro pós-apocalíptico. Neste cenário, não há mais ordem social, Estado de Direito ou moral. Apenas a sobrevivência do mais apto ou do mais sortudo. Neste cenário, o mundo não se divide em bem e mal, ética ou anti-ética. Os valores são mais imediatos, menos abstratos: sobrevivência ou morte. E é neste cenário que acompanhamos a história de Adam Collins, sobrevivente ao Evento, que retorna à cidade fictícia de Haventon em busca de sua esposa e filha, que há muito já não vê, e aliás, tem cada vez menos esperanças de encontrar com vida.

IAA-AdamCollins

O Evento, aliás, aparece no jogo como um acontecimento vago, que provavelmente engloba uma série de situações e acontecimentos catastróficos, que culminaram com a derrocada da sociedade como conhecemos. Deste vago Evento temos apenas os restos: cidades destruídas, trechos de ruas com enormes rachaduras (indicativas de terremotos de grande escala); vários setores da cidade contaminados com um tipo de poeira tóxica, que faz com que o jogador morra em pouco tempo de exposição. Adam terá que transpor todos estes obstáculos, equipado apenas com uma corda, uma pistola com, inicialmente, uma bala, um arco e flecha, um facão e suas habilidades de escalada (que nada têm de extraordinárias).

IAA-Inventorymenu
O inventário de Adam Collins: uma pobreza…

Neste game, a equipe de designers e escritores tentou passar a sensação de como seria estar num mundo pós-apocalíptico sem ser super-humano; sem ter habilidades físicas notáveis ou portar uma mochila capaz de carregar uma quantidade quase infinita de itens de inventário. De fato, a sensação de desespero por ter que, em determinado momento, usar uma simples garrafa de água para recuperar um pouquinho do life é enorme. Não há quase balas (o jogador terá, no máximo, umas 10 no inventário, quando muito), há pouca comida e poucas maneiras de se regenerar. Fica, realmente, uma sensação de sufocamento, que é reforçada pelo visual sujo e poeirento de Adam, nosso personagem principal, e das ruas e arranha-céus, todos destroçados e tortos pela catástrofe do Evento. É um jogo de Survival, e não é pra menos. O jogador terá poucos recursos, seu inventário terá sempre poucos itens e sua resistência, sempre pequena, será posta à prova a cada escalada, numa barra de Stamina que se gasta com uma facilidade bizarra. Neste mundo, o jogador encontrará sobreviventes de várias espécies:

1) aqueles que só querem continuar vivos, e farão de tudo pra que Adam não chegue perto deles; quanto a estes, não há muito que fazer, a não ser evitar chegar perto deles e tomar um tiro gratuito nos cornos.

IAA-Survivor
O negócio, aqui, é levantar os braços, andar devagarzinho, e ir saindo pelo escanteio… Sem confusão…

2) Aqueles que estão doentes ou com algum tipo de deficiência, para os quais Adam pode dar algum alívio, seja dando remédios ou utilizando algum dos poucos (e preciosos) kits de primeiros socorros; esses, por sua vez, estão espalhados ao longo do jogo, e cabe ao jogador escolher auxiliá-los ou não. O mérito do game, neste caso, é não forçar uma decisão ao jogador; cabe a este decidir se deve ou não ajudar os enfermos. Caso ajude, pode ganhar recompensas ótimas ou não ganhar nada. É uma questão de ouvir o que as vítimas têm a dizer e perceber as entrelinhas.

IAA-Helpingvictims
Aqui, a esposa pede ajuda ao marido, que está deitado no banco. Se ajudá-los, fornecendo um kit de primeiros socorros, ganhará algumas coisas interessantes…

3) Aqueles que se juntam em bandos e saqueiam tudo e todos que encontram. Já contra estes sobreviventes, Adam deverá agir de acordo com a ocasião. Ao ver o grupo de saqueadores, o jogador deve ver se algum deles está portando arma de fogo. Se sim, o jogador terá duas alternativas, ou se rende, e deixa os saqueadores chegarem perto para atacá-los de surpresa (e com boas chances de ser mal sucedido), ou aponta a sua arma (mesmo descarregada) repentinamente para aquele que porta a arma de fogo, blefando, e intimidando o mesmo, enquanto chega perto dele e o ataca, traiçoeiramente, com uma faca. Além disso, é possível ir ameaçando o inimigo, sem atirar, até que este chegue à beira de um buraco, ou precipício, e atirá-lo de lá.

IAA-surrender
Ameace o cara do facão, mesmo sem ter uma puta de uma bala na agulha (seu inimigo não precisa saber disso, né?)
IAA-MacheteAttack
Traiçoeiramente, puxe o seu facão, e, de repente, esbuceteie-lhe os cornos.
IAA-Spartaa
Ou, empurre o cidadão pra beiradinha do buraco e grite de leve: THIS IS SPARTAAAAAA!!!

O sistema de blefe e de tática de ataque, apesar de ser uma ideia brilhante, é pobremente realizado. Se o jogador cometer qualquer mínimo erro (seja baixando ligeiramente a arma sem querer), é penalizado frequentemente com a morte, já que o tempo de reação de Adam para um possível contra-ataque é sofrível. Além disso, atacar preventivamente pode ser um tiro no pé. O timing para ataque com o facão não é dos melhores, o que significa que apertar o botão na hora errada é um passaporte pro game over.

Este game ficou por volta de 4 anos em desenvolvimento, tendo sua produção parada e mudada algumas vezes. No fim das contas, isso se refletiu no produto final que é o jogo: fica a impressão de que foi feito às pressas, não tendo lá um bom acabamento gráfico final e com uma jogabilidade imprecisa, que necessitaria de mais horas com testers pra maior refinamento. O pouco acabamento gráfico se reflete nos vários itens repetidos ao longo dos cenários. Nas ruas de Haventon, vi os mesmos posters e bancas de jornais em inúmeros pontos diferentes Os carros e demais itens destroçados são genéricos e se ressentem de maior detalhamento. Dentro do shopping de Haventon, vi os mesmos móveis e caixas em inúmeros pontos diferentes do prédio, demonstrando uma falta de acabamento maior nos itens do cenário. O jogo tenta imprimir uma luminosidade claustrofóbica sobre um cenário monocromático, mas termina sendo apenas um jogo em quase preto e branco, com alguns lugares em tom de sépia, que, em vez de ser claustrofóbico, acaba sendo chato e monótono, com diversos momentos confusos.

IAA-Shelves4
Notem como os armários de prateleira da foto à esquerda são  os mesmos que aparecem em outro cenário, na foto à direita… Além disso, as caixas que aparecem no canto da segunda foto (circuladas de amarelo) se repetem à exaustão por esse e em outros cenários…

Se o jogo não consegue manter o pique claustrofóbico no visual, consegue, definitivamente, deixar tudo sombrio com sua trilha sonora. É simplesmente ótima, e me lembrou com muita frequência os temas e compassos da trilha sonora do primeiro Resident Evil. Mesmo a musiquinha de fundo, quando se abre o menu de inventário, é tenebrosa e soturna. Música nota 10. As vozes também são muito bem escolhidas, tendo, no geral, os atores um ótimo desempenho.

A trilha sonora é ótima e os gráficos, apesar de monótonos, não seriam um grande problema se não fosse a jogabilidade do game. Essa sim, muito irregular e com elementos que acabam tornando o jogo um tanto quanto cansativo, pois não há sensação de recompensa definida quando se chega ao final de cada nova conquista. Como já disse antes, uma parte ruim dessa jogabilidade se dá nos confrontos entre Adam e seus inimigos. Outra parte, pior, da jogabilidade, se dá quando Adam é levado a escalar obstáculos ao longo dos cenários. A princípio, o jogador consome o conteúdo da barra de stamina, que é um retângulo branco. Se Adam ainda estiver no meio de uma escalada, e já tiver consumido a barra branca, começa a consumir a própria barra de stamina, que vai diminuindo a cada segundo. Além disso, é necessário que o jogador pressione, o mais rápido possível, o botão R1, para retardar a consumação da barra de stamina enquanto escala. No fim das contas, quanto mais tempo o jogador perder escalando, menos resistência terá (pois sua stamina será menor). Além disso, nem sempre Adam terá à sua disposição algum item para restaurar a barra de stamina destruída.

IAA-climbing

Creio que a ideia, nesse quesito da jogabilidade, era reforçar o desespero que é lidar com um personagem que não tem realmente habilidades físicas sobre-humanas. Ele não é um Sam Fisher ou um Ezio Auditore, que podem ficar por horas pendurados, aguardando o momento certo para uma emboscada. É somente um homem normal, fraco, empoeirado. Um sobrevivente. A ideia é boa, a execução, péssima. A frustração por se ver, a cada nova escalada, prestes a não ter resistência alguma, e não ser recompensado, de alguma forma, ao fim da escalada, não vale o esforço. Em vez de ser claustrofóbico, acaba sendo desestimulante e chato.

No fim das contas, I Am Alive é um tiro que saiu pela culatra. Tinha tudo pra ser um ótimo jogo: personagens decentes, uma história que se encaminha bem para algo tocante, e uma jogabilidade que tenta rumos diferentes. Um jogo que deveria trazer algo de totalmente diferente, mas acaba não sendo nada, pois a própria Ubisoft não apostou o quanto devia nele. Ao longo do jogo, a história encaminha para algo que deveria ter sido um jogo muito maior, mas acaba deixando muitas pontas soltas. Infelizmente, é um jogo com uma grande proposta, mas uma execução medíocre. Não vale a pena e nem o esforço.

FICHA TÉCNICA.

Plataformas – Playstation 3, Xbox 360 e PC

Ano de lançamento – 2012

Nota – 4,0

Preço – de R$ 18,90 a R$ 39,90

Colossus de Cyttorak

Detentor dos segredos da Mãe-Rússia, fã incondicional de jogos da antiga SNK (antes de virar esse arremedo, chamado SNK Playmore), e da Konami, Piotr Nikolaievitch Rasputin Campello parte em busca daquilo que nenhum membro da antiga URSS poderia ter - conhecimento do mundo ocidental. Nessa nova vida, que já conta com três décadas de aventuras, Colossus de Cyttorak já aprendeu uma coisa - não se deve misturar Sucrilhos com vodka, nunca!!!!

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