Os Livros e as Armas

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Dizem que uma guerra muda a vida de um homem, e de fato é verdade. Mas e quanto ao seu trabalho? Ora, as relações de escritores com guerras é longínqua, mais do que podemos supor à priori.  Tomemos por exemplo A ilíada de Homero: poema de gênero épico que remontou à Guerra de Tróia e acabou por imortalizar o guerreiro Aquiles, conhecido até hoje por sua história e famosa expressão “calcanhar de Aquiles.” O poema é um das mais antigas manifestações da literatura ocidental, embora tenha sido durante séculos transmitido somente por tradição oral, e até hoje a existência de Homero seja questionada. A estreita relação entre guerras e literatura se estende até os dias atuais, e a Primeira Guerra Mundial não seria nenhuma exceção.

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A Primeira Grande Guerra foi um balde de gasolina que explodiu eclodindo uma série de contrastes: a relação entre os povos, imersos no que poderia ser o ápice do imperialismo iniciado no século XIX, o confronto entre moderno e antigo, numa guerra em que pela primeira vez se utilizavam tanques, metralhadoras e até aviões, e a dimensão de um confronto que acabou por tomar proporções inimagináveis, como a Revolução Russa de 1917 e a chegada de Hitler ao poder em 1933.

As artes, como todas as outras áreas da vida humana, também foram influenciadas por esses fatos. Diversos autores descreveriam suas experiências no campo de batalha e suas frustações com os rumos tomados por todos os lados ou até mesmo do lado de fora do conflito, assistindo junto ao povo a barbárie envolvida no maior conflito bélico já enfrentado até então. Vejamos alguns deles abaixo:

 

Ernest Hemingway

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Boina que pertenceu a Ernest Hemingway durante a primeira Guerra Mundial.

Hemingway, que trabalhava como jornalista na época, tenta se alistar no exército norte americano, mas não é aceito devido a um problema de visão. Hemingway era um jovem que ansiava por experiências, e sendo assim não se deu por satisfeito.  Decidiu ir à guerra a qualquer custo e acabou por conseguir uma vaga de motorista da cruz vermelha na Itália.

Lá, conviveu perto da morte e do perigo, vendo como um espectador no inferno todos os temores e as maldições da guerra. Foi atingido por uma bomba e sentiu na pele a linha tênue entre a vida e a morte no campo de batalha, sem muito do romantismo jovial que era característico na época. A experiência de guerra resulta no romance Adeus às armas, publicado em 1929, que conta a história do piloto de ambulâncias e tenente norte-americano Frederic Henry.  Depois partiu para Paris onde conviveu com diversos outros artistas e intelectuais, formando o que viria a ser a “geração perdida.” Quem assistiu ao filme Meia noite em Paris, dirigido por Woody Allen viu a cena em que Hemingway descreve uma cena de combate para Gil (Owen Wilson).

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A partir daí a relação do escritor com as guerras passa a ser mais do que íntima. Nos anos 30 Ernest parte para a Espanha para cobrir a guerra civil, com enorme furor aventureiro e espírito Republicano. Essa experiência também lhe rende outro romance chamado Por quem os sinos dobram.

Durante a Segunda Guerra Mundial Hemingway reside em Cuba para entregar informações sobre possíveis apoiadores do Fascismo para o governo norte americano.  A obra de Ernest Hemingway é religiosamente pautada no ambiente de guerras em todos os cantos do mundo, desvendando a Europa de cabo a rabo, transformando seus relatos em romances eternizados da literatura americana. E eis aí um sujeito que tinha muito para falar.

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Hemingway em Milão, no ano de 1918.

 

 

 

Franz Kafka.

 

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A guerra teve um grande impacto na vida e na obra de Kafka, ainda que ele não estivesse em campos de batalhas.  O escritor tcheco, que já possuía mais de trinta anos e falava alemão, planejava mudar-se para Berlim em 1914, porém foi impedido devido à eclosão do conflito.  Conta-se que, após publicar seu primeiro livro, foi acometido de uma crise emocional e que o motivo teria sido a própria guerra.

Em sua obra mais famosa, A Metamorfose, novela publicada em 1915, há muito do espírito europeu relacionado ao “pré” e “pós” guerra.  A história narra a transformação do jovem Gregor Samsa em um inseto, a repúdia de seus parentes próximos e até mesmo o sentimento de desilusão com o mundo. Com o uso dessas metáforas, Kafka falava sobre o sentimento de todas as pessoas que enfrentavam um combate até então nunca antes visto, com imensa capacidade tecnológica e impiedosa ferocidade. Os jovens morriam em campos de batalhas em defesa de um ideal imperialista, praticamente forçados a serem enviados e terem suas vidas sacrificadas em prol de um nacionalismo vão.

De saúde debilitada e com vários problemas pessoais, Kafka morre acometido de uma tuberculose em um sanatório de Viena, no ano de 1924. No entanto, a relação de sua vida com a guerra não acaba aí. Kafka era judeu e, durante a segunda guerra mundial, suas irmãs acabam sendo enviadas para campos de concentração nazistas, e uma delas fora inclusive enviada para Auschwitz em 1943.  Boa parte da obra de Franz Kafka seria publicada somente após o seu falecimento.

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Manuscrito de Franz Kafka retirado do site Kafka.org.

 

 F. Scott Fitzgerald.

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Fitzgerald também era bem jovem quando o arquiduque Francisco Ferdinando foi baleado em 1914, dando início ao confronto militar. O entusiasmo juvenil e a necessidade de experiência fizeram com que o jovem se alistasse no exército norte americano para lutar ao lado dos aliados na Europa.  Passou por treinamento militar no Alabama e lá conheceu o amor da sua vida, Zelda Sayre.  No entanto, antes que pudesse ser enviado ao front de batalha para enfrentar os alemães, a guerra mundial chega ao fim, em 1918. Scott Fitzgerald então é dispensado e assim começa a galgar sua carreira como escritor em 1920, com a publicação de Este lado do paraíso.

Mudou-se para a França onde escreve seu mais célebre romance chamado O grande Gatsby, em 1925. A obra retrata abertamente todo o caos e males causados pela Primeira Guerra, e traça um contraste com o excesso de materialismo e a hipocrisia de alguns membros das altas classes norte-americanas. O romance é ambientado na America pós-guerra, com o furor econômico anterior à grande depressão e a vigência da lei seca, que impedia a venda de bebidas alcóolicas.

Escritores são, como disse Machado de Assis, “homens de seu tempo” e não poderia ser diferente em se tratando da maior guerra que o mundo tinha visto até então. Todos assistiam, estarrecidos, à luta imperialista, ao péssimo início do século XX e aos rancores e situações que proporcionariam poder a regimes totalitários e sangrentos. Os homens pegaram em armas e foram defender suas pátrias com convicções extremistas e ideais de morte. Numa época em que o barulho das armas e dos ditadores enfurecidos calaram a população, alguém teve que dizer alguma coisa.

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Joel Junior

Colaborador

Colaborador não é uma pessoa, mas uma ideia. Expandindo essa ideia, expandimos o domínio nerd por todo o cosmos. O Colaborador é a figura máxima dos Iluminerds - é o novo membro (ui) que poderá se juntar nalgum dia... Ou quando os aliens pararem com essa zoeira de decorar plantações ou quando o Obama soltar o vírus zumbi no mundo...

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