O Brasil e o quase naufrágio à vascaína.

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Após oito anos sem conquistas relevantes, com jogadores escabrosos e sempre beirando a zona de rebaixamento, um homem era hegemônico. Seu charuto típico; a camisa de listras verticais e os óculos redondos me davam a impressão de que lidávamos com alguém que detinha o poder: o homem que manda.  Não foram poucos os tumultos em sua carreira, desde fortunas incomprovadas até ser vítima de um roubo, no mínimo, estranho, que sofreu enquanto levava toda a renda de um dos maiores clássicos do país para sua casa.

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Eurico – A sombra do pôr do sol.

Folclórico e assumidamente apaixonado pela mesma puta que fazia questão de extorquir, ele me representou por anos, com graça, através de ótimas entrevistas e de uma extrema agressividade. Eu o adorava. Tinha a prepotência, a arrogância e a certeza de impunidade que somente os grandes Dons de Coppola poderiam exalar. Era um típico Senhor: com distinção e personalidade que o levaram a se achar muito mais que um dirigente E assim, ele se tornou deputado. Nada no mundo poderia deter aquele sujeito. Ele era o sinônimo do poder. O sinônimo de como a graça obtida por vias tortas poderia custar caro.

Henrique e sua gol salvador contra o Atlético Paranaense.
Henrique e seu gol salvador contra o Atlético Paranaense.

Contudo, as velas do destino fizeram o favor de soprar novos ares. Agora eu era universitário, cursava uma das cadeiras mais críticas de qualquer universidade e, finalmente, abria os olhos para o mundo que me cercava. Lembro-me até hoje da primeira vez em que acompanhei uma eleição presidencial do meu clube predileto. Era início de junho, o vento frio do inferno começava a querer assoprar, contudo, acima de tentativas de golpes, ameaças e defuntos votantes, a democracia voltou a imperar no Clube de Regatas Vasco da Gama com a eleição de Roberto Dinamite, o maior ídolo e artilheiro pelo clube da cruz de malta.

“Encerrando mais de duas décadas de domínio de Eurico Miranda e de seu grupo político no clube. Sua chapa teve 140 votos, contra 103 da liderada pelo situacionista Amadeu Pinto da Rocha, apoiado por Eurico. O maior artilheiro da história do Vasco vai comandar o clube por três anos a partir do dia 1º de julho.” UOL Esportes

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E Roberto nos disse:

” O Vasco é grande demais e merece ser respeitado e tratado com o maior carinho. É o momento em que as pessoas que gostam do clube se unam a nós e contribuam para que o Vasco volte a ser forte e campeão”

Foram as suas primeiras palavras como presidente eleito. Um pouco antes – quatro anos, para ser mais exato – mas num cenário político parecido, outra grande reviravolta acontecia, no entanto, desta vez, era a nível nacional e de relevância muito maior.

Dez anos antes da vitória do goleador com apelido de explosivo, uma grave crise econômica tomava o país, resultando na queda de crescimento, emprego e aumento da dívida pública. Asim como a gestão de Eurico Miranda, o governo FHC também nos trouxe oito anos de conquistas irrelevantes, privatizando grandes fontes de recursos como a Vale e a CSN, além de escândalos devidamente arquivados pelo engavetador geral da república. Por coincidência, também sofremos uma tentativa de golpe, com a compra de votos para a reeleição e até a ameaça de violência pelas elites que a nós nada representavam.

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Por azar, o Brasil não era diferente do meu clube predileto. Eu o  amava, mas não conseguia ter orgulho, afinal, como bater no peito e bradar o lema “ eu sou brasileiro” quando alguém que quita a minha representatividade está no poder? No entanto, assim como fiz com o meu clube favorito, jamais deixei de torcer. No entanto, quando a situação se tornou insustentável, uma sombra de desconfiança apossou-se de todos nós, e, embora, o partido midiático colocasse toda a sua artilharia de “economistas e comentaristas políticos” para alertarem que a alternância de poder seria um risco ainda maior, felizmente, a hegemonia foi quebrada e, pela primeira vez, o partido dos trabalhadores conseguiu eleger um Presidente da República. Luís Inácio “Lula” da Silva, que após três grandes revezes, finalmente trazia a vontade do verdadeiro povo brasileiro – sim, a maioria do povo é sua verdadeira imagem – nesta que foi uma das maiores lavadas eleitorais da história.

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E no discurso da vitória Lula nos disse:

– Por fim, eu quero dizer pra vocês que o Brasil está mudando em paz. E, mais importante, a esperança venceu o medo. E hoje eu posso dizer para vocês que o Brasil votou sem medo de ser feliz.

Passado algum tempo, o que deveria ser apenas comemoração, a história não foi como a gente imaginava. Em um certo clube de futebol, algumas promessas foram cumpridas – conquistamos um título inédito – contudo, a imaturidade no poder somada às sabotagens internas- daqueles que um dia se disseram aliados – fizeram com que a vitória dos verdadeiros vascaínos fosse minada. Num curto espaço de seis anos sofremos dois rebaixamentos, sendo o último culpa exclusiva do atual mandatário…

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Na verdade, não. Para quem tem boa memória não é difícil lembrar-se dos embargos sofridos e dos 100% da verba penhorada, fato que nos fez desmanchar um dos melhores elencos da década. Também não podemos nos esquecer dos erros escandalosos de arbitragem e das derrotas vexatórias no STJD.  E, depois de tudo isso, de repente a reviravolta dos verdadeiros vascaínos acabou e as velas da fragata iam de mal a pior. Sem mais, os ventos revoltosos, novamente, clamavam por mudanças, até que diante da insignificância dos atuais candidatos, o pior aconteceu. Eurico teve 2.733 contra 1.570 de Júlio Brant e 1.155 de Roberto Monteiro. O Clube de Regatas Vasco da Gama regressaria a estaca zero.

Ps: Repararam a diferença no número de sócios?

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Para alguns leitores talvez pareça estúpido e até criminoso comparar uma agremiação esportiva com um país. Talvez até seja. Contudo, é inegável como a nossa fé por mudança, somada à indevida pressa por grandiosas conquistas, pode ser convertida na pior das mazelas para o futuro; a descrença e consequente conivência com a perpetuação dos crápulas antes expurgados. Contudo, por que levantei esta questão? Será que é apenas choro pela vitória daquele a quem fui contrário? Ou será que realmente existe alguma similaridade entre as eleições vascaínas e presidenciais, ocorridas com apenas um mês de diferença?

Retomando o paralelo, após doze anos da vitória do primeiro operário Presidente do Brasil, agora somos regidos pela primeira mulher que, apesar de toda a pressão sofrida por seu gênero, ao afirmar-se como PresidentA, manteve a crescente do país garantindo-nos muitas conquistas, especialmente, no que diz respeito à redistribuição da riqueza social e planos de intervenção sobre as necessidades básicas como + Médicos, PROUNI E REUNI.

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Seja pelo conservadorismo ao aceitar um político mineiro do PL, ou com o colega atual do PMDB, em função dos setores empresariais, ou por tentar implementar um projeto político em meio as rédeas da governabilidade,  infelizmente, o Brasil não cresceu em velocidade proporcional a ânsia de nossos sonhos – doze anos de ações condicionadas a uma Câmara e Senado nebulosos contra quase quatro décadas de exploração – e ainda falta muito caminho a pavimentar. Contudo, acima das evidentes falhas, também cometidas por seu antecessor, é impossível não comentar a persistente pressão interna de partidos que deveriam ser aliados e uma crescente difusão da desinformação  mesclada à política de ódio contra seu nome (Dilma) e partido (PT) –  através do mesmo partido midiático derrotado em 2002.

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Desta forma, muito acima de propagandas pró-PT, exponho uma reflexão sobre o risco pelo qual passamos. Afinal, ao buscarmos, de qualquer maneira, o vislumbre de um país que em época alguma foi perfeito, por simples e míseros pontos percentuais, quase pagamos o preço mais caro. Quase sofremos o retrocesso de uma década. Por um triz não tivemos o mesmo fim do Clube de Regatas Vasco da Gama, com o nosso próprio Eurico, dessa vez, um politiqueiro autoproclamado bastião da moral e dos bons costumes. Por muito pouco, não transformamos a esperança de melhorias no pior dos venenos.

Ps: Nordestinos, pobres, gays ou qualquer outro grupo que se encaixe no perfil de minorias em empoderamento social, se vocês foram os verdadeiros culpados pelo resultado desta eleição, muito obrigado! Chupa mainardi – com letra minúscula mesmo!

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Quanto aos vascaínos, só nos resta torcer para que tudo dê certo, pois, diferentemente, da conduta de muitos eleitores – que, nesse aspecto, talvez devessem ver o país como um clube de futebol – , todos nós torceremos pela vitória.

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Don Vitto

Escritor, acadêmico e mafioso nas horas vagas... Nascido no Rio de Janeiro, desde novo tivera contato com a realidade das grandes metrópoles brasileiras, e pelo mesmo motivo, embrenhado no submundo carioca dedica boa parte de seu tempo a explanar tudo que acontece por debaixo dos panos.

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