É, rapaziada. Ben Affleck não tá só parado no morcego e vem investindo em projetos inusitados e, pelo menos, interessantes. Assim também é esse filme: Garota Exemplar.
No filme, vemos Ben Affleck como Nick, um ex-aspirante a escritor que se casou com Amy (Rosamund Pike), estrela real e inspiração para uma série de livros infantis que faz sucesso há décadas, chamada Amy Exemplar. Seria o equivalente, no Brasil, à filha do Maurício de Souza, que foi inspiração para a protagonista da Turma da Mônica.
Nick e Amy protagonizam aquilo que seria o usual de uma história de amor: os laços e promessas românticas iniciais que acabam desembocando em tudo aquilo que os personagens principais mais odeiam. Nick, de esposo atencioso e devotado passa a ser um marido frio e fugidio, enquanto Amy, antes romântica e desprendida, com o passar do tempo passa a ser uma mulher rancorosa e hipercontroladora. É nesse clima pesado que encontramos Nick que, no dia do aniversário de 5 anos de seu casamento, percebe que Amy simplesmente some, enquanto várias evidências circunstanciais começam a aponta-lo como possível suspeito pelo sumiço da esposa.
A direção de David Fincher é simplesmente fantástica. O diretor sacramenta sua extrema habilidade em suspenses, já consolidada em filmes excepcionais como Seven – Os Sete Pecados Capitais; Zodíaco e A Rede Social. Conjugado a uma excelente edição, a direção do filme intercala com extrema naturalidade cenas de flashbacks e atuais, sem em nenhum momento parecer confuso ou perder o fio da meada para o espectador. A fotografia também é excelente e abusa de tons secos e monótonos. Nesse sentido, o filme é tão bem conduzido que se passa, tranquilamente, as quase 3 horas de filme num estado de tensão constante. Novamente, Fincher mostra que é um exímio contador de suspense, e, apesar dos vários furos no roteiro, consegue manter o ritmo e um filme interessante de ser visto.
Ben Affleck, por outro lado, demonstra cada vez mais maturidade, e está conseguindo dar um rumo interessantíssimo pra sua carreira, encarando papeis que caem como uma luva no seu estilo de interpretação. Sem exagero algum, a cada filme que passa, vejo um novo Clint Eastwood em plena formação: um ator que escolhe a dedo os filmes em que atuará, e que demonstra cada vez mais talento para a direção. Rosamund Pike surpreende com sua personagem cheia de reviravoltas e leva o filme com muitíssima dignidade. Essa moça tem muito talento e ainda vai longe. A maior surpresa, na minha opinião, foi ver o Neil Patrick Harris, num papel completamente diferente do seu fantástico Barney Stinson, da sensacional série How I Met Your Mother. O ator demonstra realmente ser versátil e consegue fazer seu personagem ao mesmo tempo controlador e cativante, sem ser falso ou postiço.
O filme é bastante eficiente na crítica à opinião volúvel de grande parte da população, demonstrando o quanto o sensacionalismo televisivo e conduções duvidosas podem influenciar facilmente a massa. Assim, Nick passa a ser visto pela mídia de vilão assassino a marido devotado e arrependido por tudo que tenha feito de errado em seu casamento. Por outro lado, se o filme é fantástico a partir do ponto de vista da atuação e da direção, peca bastante na verossimilhança interna dos personagens, principalmente de Amy, que é uma personagem que tinha tudo para ser extremamente complexa e acaba resolvendo suas ações de maneira equivocada e contrária a tudo que foi estabelecido pra ela ao longo do filme.
Infelizmente, não há como falar dos furos do roteiro sem deixar spoilers e revelar algumas das várias reviravoltas que se passam ao longo do filme e que, sinceramente, acabam sendo a grande graça da película. É um filme razoável e que vale uma olhada, nem que seja pelo excelente trabalho do diretor, equipe técnica e elenco e que peca por um roteiro que desenrola muito mal sua protagonista nos momentos finais do filme.