Iluminamos – 4ª temporada de Bojack Horseman

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A quarta temporada de Bojack Horseman estreou na Netflix no começo de Setembro, e vem com um clima mais sensível, aprofundando ainda mais a personalidade de Bojack. A temporada começa com Horseman desaparecido. Depois de uma tentativa de suicídio malsucedida, o paradeiro dele é desconhecido; o que nos permite ver mais dos personagens secundários, como Diane Nguyen, Sr Peanutbutter, Princesa Carolyn e Todd Chavez. Como é de costume, a série aborda vários temas pesados, e alguns até bem polêmicos, de forma humorística, mas bem reflexiva; entretanto, sempre tem um assunto que se destaca. Nesta temporada, o tema em destaque são as relações pessoais e familiares, tudo gira em torno da família, desde as dificuldades de se constituir uma relação até traumas passados de pais para filhos.

Tentando lidar com a trágica morte de Sarah Lynn, Bojack se isola na casa dos avós maternos, numa cidade pequena, mas por não conseguir se adaptar ao estilo de vida do local, ele decide voltar para casa. De volta a Hollywoo, ele é procurado por uma adolescente de 17 anos, chamada Hollyhock, que desconfia ser filha dele. Após exames de DNA comprovarem o parentesco, Bojack mantém a “tradição Horseman” de ser um péssimo pai, tentando afastar a menina e até mesmo ofendendo-a. No entanto, Hollyhock é filha adotiva de “oito homens gays numa relação estável poliamorosa”, e diz para Bojack que não está em busca de um pai, e sim de sua mãe, e que quer ajuda dele para encontrá-la.

Todos sabemos que Bojack não se dá bem com sua mãe, Beatrice; e várias vezes já tivemos provas de que não é sem motivo. A Sra. Horseman é extremamente crítica com o filho, sempre que pode o culpa pelas desgraças de sua própria vida, e o desestimula. A mãe é tóxica, abusiva, e sem dúvida nenhuma, a maior formadora do caráter de Bojack. Por isso, quando Hollyhock vem procura-lo, para que ele ajude a encontrar a mãe dela, Bojack acaba enfrentando seus maiores traumas de sua infância, de ser uma criança fruto de uma mãe abusiva com um pai ausente. Na busca pela mãe de Hollyhock, somos apresentados à mãe e a avó de Bojack, através de flashbacks que se juntam com a história atual, mostrando como os incidentes do passado influenciam e se repetem no hoje. Isso permite, finalmente, que criemos uma empatia pela Beatrice Horseman.

Outro ponto que a série sempre retrata, e que também foi muito bem trabalhada nesta temporada, é o feminismo. Beatrice Horseman é filha de um pai ausente e casa-se com um homem assim. Ela e a mãe, embora com ações e consequências diferentes, acabam tendo destinos trágicos, graças ao machismo e ao abandono do marido; ambas se casam com homens que não assumem a paternidade de fato, sobrecarregando-as com as ditas “obrigações femininas”. A forma como isso as afeta e afeta os filhos é deprimente, mas muito real.

Hollyhock foi uma grande agregação ao elenco, por permitir um aprofundamento da família Horseman, e propiciar um dos momentos mais incríveis de uma série de animação; Bojack passa vários dias com crises de ansiedade e depressão, que ele tenta aliviar com a bebedeira e drogas. Até que, finalmente, tenta criar vínculo com a filha, e ela lhe conta sobre as “vozes na cabeça” que dizem que ela é um lixo, que não deveria estar viva, e pergunta para ele “isso vai passar, não vai? ”.

A Princesa Carolyn também foi muito bem aproveitada, e particularmente, é a minha personagem preferida. Um dos episódios mais tristes da temporada é enfocado nela; ela supera Bojack, e começa a namorar, mas há muitos impedimentos para esse relacionamento, um deles é que a família do rapaz é de ratos que odeiam gatos. E ainda tem a dificuldade de ela de engravidar, e lidar com a vontade de ter uma família, com a pressão de sentir que “está ficando velha demais” e o medo de não ter mais tempo pra isso.

Diane e Sr Peanutbutter são com certeza um dos casais mais complicados da TV. Confesso que não gostei muito deles nessa temporada, pois o foco parece ser sempre o mesmo: “como esses dois conseguem ficar juntos, se são tão diferentes, se discordam tanto, se brigam tanto? ”. Mas eles dão um jeito. Casamentos são conturbados? O deles é. O interessante foi observar como a construção de uma vida como casal pode ser complicada, pois Diane evita se envolver nas decisões sobre a casa, mas quando o Sr Peanutbutter decide coisas sem lhe perguntar, ela se sente ofendida. Num dos episódios ela se descreve como “um poço onde as coisas boas desaparecem”, uma mostra de como o casamento a está afetando. Já o Sr Peanutbutter se esconde atrás da “inocência” para cometer ações maléficas pro casal; como insiste em viver uma eterna infância, fica difícil conviver como adultos.

Mas, Todd Chavez foi, infelizmente, o ponto mais fraco. Embora tenha se assumido assexual, uma forma de sexualidade bem esquecida no churrasco, quase nunca debatida. E o mais legal é que eles não tratam isso como algo anormal ou fazem piadas; tudo é encarado de forma bem normal, o que é positivo. Só que Todd acaba virando alívio cômico, e suas cenas às vezes são cansativas e “alucinadas” demais.

O final da temporada é bem interessante, e se não tivesse uma quinta temporada, já seria uma série com um final bom, com poucas coisas deixadas em aberto. Mas se tiver uma próxima, espero que seja tão boa, ou até melhor que essa. No final, há uma certa “remissão” de Bojack e de sua mãe, não que justifique o que eles fazem e são, mas explica e cria empatia.

Os demônios que nos maltratam talvez sejam apenas traumas que causaram feridas que não cicatrizaram, e estão infeccionando…

Hypolita Prince

"Nerd" por acaso, e ainda não satisfeita com a denominação. Escrevo sobre feminismo, e outros assuntos que me interessem. Não os desenvolvo tanto quanto gostaria, mas é por preguiça de organizar as ideias nos textos.

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