Especial FIQ 2013: a palestra sobre mangá que nunca aconteceu – Parte 2 (final)

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Continuando o relato sobre a mesa redonda que deveria ser sobre quadrinhos japoneses do Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ) de 2013, mas que se transformou numa espécie de homenagem ao cenário de RPG Tormenta, nesta segunda e última parte veremos que o tema original eventualmente foi abordado com mais afinco, se tornando finalmente o centro da fala dos autores. Para não ficar perdido, sugiro clicar neste link e ler a primeira parte deste texto.

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Como artista, Daniel HDR expos sua opinião sobre o mangá, explicando o que, em sua opinião, seriam as diferenças entre os quadrinhos oriental e ocidental. “Em primeiro lugar não tem como não falar do aspecto narrativo, no mangá a história tem começo, meio e fim. Eu só lia quadrinhos americanos e quando passei a ler os japoneses foi um choque. No mangá também você tem mais flexibilidade na condução da história. Os comics seguem uma estrutura mais rígida, se é drama, é drama do começo ao fim, se é comédia, é comédia do começo ao fim…e, assim por diante”, ressaltou. De acordo com Daniel, essa sucessão de assombos e impressões positivas também ocorreu em termos artísticos. Para ele,“o mangá se constitui [ou se constituia] visualmente de maneira diferente dos comics que eu costumava ler. Câmera no pé, ângulo aberto, speedline, o dinamismo, a lacuna entre os quadros e os ângulos… hoje em dia, esses elementos se difundiram e passaram a influenciar a maneira como se faz quadrinhos no mundo todo. É por causa dessa mistura que os quadrinhos de maneira geral alcançaram um novo patamar artisticamente, é possivel fazer Turma da Mônica em estilo mangá, Astronauta em estilo europeu. São os quadrinhos fazendo o que o Esperanto não fez”, complementa.

HDR pensativo....E pra quem seria a cadeira vazia?
HDR pensativo….E pra quem seria a cadeira vazia?

Ainda sobre os elementos gráficos, Lobo Borges falou um pouco de como o mangá e, de certa forma, a cultura japonesa como um todo influenciaram sua trajetória como artista. “Assim como vocês, sou um órfão da TV Machete. Foi uma experiência muita rica para minha e o desenvolvimento da minha arte. Toda aquela ação, as explosões, armaduras, a folha caindo para representar que o personagem está morrendo”, exemplificou.

Como não podia deixar de acontecer numa mesa com Marcelo Cassaro e Petra Leão, roteiristas da franquia Turma da Mônica Jovem (TMJ), que adapta a obra de Maurício de Sousa para o que se convencionou chamar de “estilo mangá”, o bate-papo não deixou de entrar também nesta temática. Cassaro destacou o empreedorismo do quadrinista transformado em empresário, segundo ele é o sucesso da TMJ se deve a inteligência de Maurício. “O mérito é dele por ter essa visão, do ponto de vista dos negócios e dos quadrinhos”, apontou Cassaro.

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Do que será que o Cassaro estava rindo? Nem eu que estava lá lembro. Acho que alguém deve ter perguntado como estava a conta bancária por estar envolvido em tantos projetos

Já Petra preferiu falar um pouco de seu processo criativo, principalmente de como é trabalhar no universo de Maurício de Sousa. “No Japão existe o shoujo, gênero de mangá dedicado às mulheres. Como roteirista e mulher tento adicionar um pouco desse universo feminino à TMJ. Dar um tom de shoujo mangá, mas também permeado de aventura. É preciso deixar claro que não estamos fazendo um mangá, é Turma da Mônica em estilo mangá, há uma diferença. Emular muita gente emula, mas o que ele conseguiu fazer foi um híbrido”, explica. Por outro lado, ao adaptar um material previamente existente e como uma legião de fãs de todas as idades, é preciso tomar certos cuidados pra que o resultado final saia a contento. Há um delicado equilíbrio entre liberdade criativa, linha editorial da empresa e a sensibilidade dos fãs. Neste sentido, Petra afirma, “o Maurício nos dá liberdade total pra escrevermos sobre o que quisermos, mas claro que tem um limite. Têm alguns temas, abordagem ou situações que não podemos fazer ou retratar. Teve uma vez que pensamos em matar o Capitão Feio, a ideia era que ele voltaria logo depois, mas mesmo assim não rolou”.

Por fim, um dos assuntos mais polêmicos da tarde surgiu, trazido pela pergunta de uma dos presentes, a pirataria. Com seu método de divulgação e distribuição relativamente inovador por aqui (mesmo que não seja necessariamente inédito), o mangá Ledd que está disponível on-line oficialmente acabou entrando também na pauta quando seu autor, J. M. Trevisan, se propos a responder o questionamento do espectador. “A gente nunca apoia a pirataria porque os autores ganham efetivamente muito pouco com o que vendem. Mas ao mesmo tempo ela é inevitável. Então, a questão se torna como trazem a pirataria pro nosso lado”, argumentou Trevisan. Ele ainda fez algumas revelações bastante sinceras, porque de certa forma a pirataria contribuiu para a criação de Ledd. “As pessoas compram e baixam. Na concepção de Ledd mesmo, durante o trabalho comecei a ler One Piece e eu lia os scans, ainda assim gastei mais de mil reais [com a série]. Com Ledd, nossos dados mostram que tem gente que espera pra ler impresso.  Nós sabemos que a pirataria serve como forma de divulgação, por isso, se for baixar, prefiro que seja do meu site. E acredito que o fã mesmo prefere pagar os dez reais e ter seu exemplar”, finalizou Trevisan, também encerrando a mesa de debate.

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Aproveitando o ensejo, mais informações sobre as diferenças entre as duas formas de arte sequencial podem ser encontradas na dissertação de mestrado deste iluminado iluminerd. Disponibilizada em duas partes na Biblioteca de Teses e Dissertações da Uerj: parte um e parte dois. (Jabá)

Zé Messias

Jornalista não praticante, projeto de professor universitário, fraude e nerd em tempo integral cash advance online.

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