CINE REFLEXÃO – FILMES PARA PERDER A FÉ NA HUMANIDADE E RECUPERÁ-LA EM SEGUIDA.

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Vamos lá, minha relação com cinema sempre foi muito mais intensa do que com qualquer outra mídia. Eu devo a ele muitas tomadas de decisões a partir de reflexões propiciadas por momentos cinematográficos. Exagero? A psicologia, a educação e outras áreas afins se utilizam do cinema amplamente com esse mesmo objetivo – promover a reflexão sobre algum tema.

O cinema, por propiciar a sensação de imersão, uma vez que quase todos os sentidos são usados em sua apreciação, é capaz de nos ajudar não só a lidar com certos conflitos como também pode facilitar a apreensão de certos conteúdos. Não à toa, há uma enorme gama de filmes históricos e baseados em fatos à disposição dos mais exigentes espectadores.

O exercício que proponho aqui é de assistir aos filmes indicados na ordem em que irei expô-los com o objetivo de fazer você perder a fé na humanidade e recuperá-la em seguida. Topa?

O primeiro da lista é um filme controverso, mas um dos que considero OBRIGATÓRIO na vida de qualquer pessoa – Dogville (2003), do polêmico Lars Von Trier. Se você não está familiarizado com a obra do diretor dinamarquês, aviso que assistir seus filmes é sempre algo doloroso e intenso, ainda assim, extremamente necessário. Com Dogville não é diferente. Começando pela concepção da película: não há cenário. O filme todo se passa em um tablado, sem imagens externas, sem efeitos especiais, sem nada mesmo. É como assistir a uma peça dramática em que você conta apenas com o talento dos atores e garanto que, se você superar o estranhamento inicial, é justamente esse talento que faz com que Dogville seja um filme surpreendente. Com atuações impecáveis de Nicole Kidman e Paul Betanny, a história começa com a chegada de Grace (Nicole Kidman) a um pequeno vilarejo. Fugindo de gangsteres que querem matá-la, ela recorre à bondade dos moradores do lugar para abrigá-la. Mas como nessa vida nada é de graça e o ser humano pode ser muito, muito podre, ao longo da trama entendemos que pequenas gentilezas que dispensamos a alguém, com o tempo são interpretadas como obrigações. O que se sucede a seguir é a constatação de que a humanidade é extremamente cruel e Grace passa a ser vítima de todo tipo de humilhações. A história fica tão pesada que a única opção que nos resta é seguir para o próximo filme.

A Vila (2004), de M. Night Shyamalan é um daqueles filmes que faz muito mais sentido quando você assiste pela primeira vez, pois, como Sexto Sentido e Os Outros, uma vez o mistério desvendado, ele deixa de ser um mistério, não é mesmo? Ainda assim, lembre-se de que você perdeu sua fé na humanidade ao sair de Dogville e precisa tomar atitudes drásticas para se proteger do mundo. Aí, você se junta com um grupo de pessoas que também não aguentam mais a crueldade da civilização e se mudam para uma vila, sem TV ou qualquer contato com o mundo exterior e se organiza de forma que ela seja totalmente autossuficiente. O elenco também é impecável: William Hurt, Bryce Dallas Howard (que inclusive faz o papel de Grace na continuação de Dogville em On Manderley), Joaquin Phoenix, Sigourney Weaver… enfim, todo mundo feliz e contente vivendo no mundo ideal. Mas, péra, tem os jovens, né? Como convencer os jovens que viver ali naquele mundinho é uma ideia sensacional? Se eu contar, é spoiller, mas A Vila nos faz pensar até onde iríamos para proteger quem amamos. Será que as atitudes tomadas pelos anciãos da vila são justificáveis? Talvez você termine o filme pensando que pode haver alguma esperança na humanidade e aí então você assiste ao último filme da sequência.

Corrente do Bem (2000), de Mimi Leder, com Kevin Spacey, Helen Hunt, Haley Joel Osment, é um daqueles filmes que, se a gente explica, parece muito piegas, mas também considero obrigatório, principalmente para adolescentes. A ideia da corrente do bem sugerida como projeto escolar pelo professor de Estudos Sociais, interpretado por Kevin Spacey, é que os alunos incentivem outras pessoas a realizarem três atos de bondade aleatórios (Random act of kindness) com uma condição – as pessoas ajudadas devem fazer o mesmo por outras três pessoas. A partir daí, uma verdadeira corrente de bondade se espalha pela cidade, nos lembrando que, se cada um fizer a sua parte, o mundo pode sim se tornar um lugar melhor. Embora o final não seja o esperado por muita gente, a mensagem do filme é emocionante, do tipo que faz muito marmanjo chorar.

Tenho pensado muito sobre isso ultimamente porque as redes sociais, por maiores que sejam os seus méritos, também conseguem exacerbar nossas piores características. Eu mesma tenho que lidar com tipos de trolls que acreditam na agressão do outro como o caminho para conseguirem seus objetivos, quando, na verdade, eu e você sabemos que existe uma lei da física que é implacável e uma das poucas que o universo realmente leva muito a sério: toda ação tem uma reação inversamente proporcional. Ou seja, aqueles ditados populares que ouvimos desde pequenos reforçam a ideia de que não devemos fazer aos outros o que não gostamos que façam conosco. Por isso, quando dizemos que você colhe o que planta, que tudo que vai, volta e assim por diante, estamos lembrando que o universo retribui suas ações na mesma medida que você as realiza. Se não gosta de ser maltratado, porque dispensar seu ódio e frustrações nos outros? O que realmente ganhamos quando agredimos alguém além do ódio? Cá entre nós, até onde eu sei, o ódio já causou muitos problemas, mas até hoje não resolveu nenhum.

Dogville-movie

Por isso, fica a dica dessa sequência linda de filmes. A esperança é para que, quem assisti-la, possa refletir um pouco sobre suas ações e quem sabe passar a mensagem adiante, né?

Dani Marino

Dani Marino é pesquisadora de Quadrinhos, integrante do Observatório de Quadrinhos da ECA/USP e da Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial - ASPAS. Formada em Letras, com habilitação Português/Inglês, atualmente cursa o Mestrado em Comunicação na Escola de Artes e Comunicação da USP. Também colabora com outros sites de cultura pop e quadrinhos como o Minas Nerds, Quadro-a-Quadro, entre outros.

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