Brainstrume – Brasil Sem Vergonha

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A expressão “sem vergonha”, utilizada no título deste texto, não se refere à conotação usual de “safado” ou “imoral”, mas à ausência do sentimento de “vergonha” na população brasileira como um todo.

Eu costumava dizer que o principal problema do brasileiro era a falta de bom senso. Contudo, o obstáculo para chegarmos a um país minimamente digno é mais profundo. E negativo. O brasileiro não tem vergonha de fatos que deveriam revoltá-lo, enojá-lo. E, pior, ainda enaltece casos que deveria esconder, exterminar, excluir qualquer vestígio de sua existência.

O brasileiro não tem vergonha de deixar tudo para cima da hora e correr para cumprir o prazo de qualquer maneira para, depois, se vangloriar de que conseguiu fazer num espaço curto de tempo. Mas se esquece de que, para isso, fez obras sem licitação, ocultou gastos excessivos, executou ações de maneira porca, não deixou nenhum tipo de legado para a posteridade, desviou dinheiro, prejudicou pessoas, cometeu atos ilegais, imorais, etc.

urlO brasileiro não tem vergonha de pagar para um deputado um salário que ultrapassa os R$ 26.000,00 e ainda dar verba de gabinete, verba indenizatória (gasolina, comida, hospedagem, aluguel de escritório e consultorias), auxílio moradia, cota postal e telefônica, impressões e assinaturas, passagens e assistência médica.

O brasileiro não tem vergonha de gastar mais de R$ 950.000,00 na reforma de um estádio, além de outros gastos como obras, contratações, compras, desvios ilegais etc. – e usar como justificativa que toda essa “operação” seria benéfica ao país.

O brasileiro não tem vergonha de decretar feriado durante a permanência do Papa no Rio de Janeiro e ainda gastar R$ 118 milhões para a participação do velhinho na Jornada Mundial da Juventude, cujo lema é “Ide e fazei discípulos entre todas as nações!”. Ou seja, dinheiro público gasto para criar devotos religiosos. Que tal usar esse capital e criar estudantes? Profissionais? Especialistas?

O brasileiro não tem vergonha de rebatizar o Túnel Acústico para Rafael Mascarenhas, um estudante e guitarrista de 18 anos que morreu atropelado enquanto andava de skate na via, apesar de estar interditada. Que tal rebatizar a Rodovia Washington Luís para Wanderson dos Santos, o ajudante de caminhoneiro de 30 anos atropelado pelo filho de Odin? Ou ainda, que tal mudar o nome do Túnel do Joá ou do Canal de Parapendi para Patrícia Amieiro?

O brasileiro não tem vergonha de até hoje ser uma colônia, não de Portugal, mas dos próprios interesses pessoais e egoístas.

O brasileiro não tem vergonha de considerar o público como de ninguém, então, livre para fazer qualquer coisa: roubar, desviar, gastar, perder, sujar, quebrar e por aí vai.

O brasileiro não tem vergonha de Esquenta, de Faustão, de ver na televisão a Bondedasmaravilhas8mesma porcaria há mais de 40 anos.

Onde está a vergonha do brasileiro que chama ex-BBB de celebridade, Quadradinho de 8 de música, funk proibidão de cultura, jogador de futebol de ídolo, novela de arte; ou R$ 678,00 de salário, Lula de exemplo, Mundial de supermercado,  call center de atendimento?

Onde está a vergonha do brasileiro que grita pelo fim da corrupção, mas paga R$ 100,00 de propina a um guarda municipal para não ser multado por falar no celular enquanto dirigia?

Onde está a vergonha do brasileiro quando estaciona em frente a uma rampa para deficientes ou ocupa o elevador, impedindo um cadeirante de usá-lo?

O que mais me assusta é saber que o político porcaria tão criticado por todos é, simplesmente, o cidadão após vencer uma eleição. É nessa aquisição de poder que constatamos o quanto o brasileiro é despreparado para viver em sociedade.

Quer saber o que é o brasileiro? Pegue seu carro e tente dirigir seguindo as regras de trânsito; assista a uma assembleia de condomínio; dê o troco errado para mais; entre no final da fila e observe quanto tempo levará para ser atendido (e isso vale para japoneses também); diga que o voto não será mais obrigatório; tombe um caminhão de qualquer coisa no meio da rua (as pessoas brotarão do chão para saqueá-lo), etc.

Normalmente, eu opto por terminar um texto propondo soluções. Infelizmente, nesse caso, não tenho nenhuma.

A não ser que reiniciar o Brasil do zero seja uma…

Gustavo Audi

Se fosse uma entrevista de emprego, diria: inteligente, esforçado e cujo maior defeito é cobrar demais de si mesmo... Como não é, digo apenas que sou apaixonado por jogos, histórias e cultura nerd.

Este post tem 26 comentários

  1. JJota

    Um casal de amigos holandeses veio passar uma temporada aqui e ficaram chocados com duas coisas: os preços cobrados e o péssimo atendimento de todos os serviços públicos! Eles diziam que a mídia pra eles lá havia convencido-os de que o Brasil estava super desenvolvido.

    Chegar em um hospital após ser atropelada por um menor de idade guiando uma moto roubada e não encontrar médico de plantão, sendo (mau) atendida por uma enfermeira irritou minha amiga. E ir a uma delegacia e descobrir que nem o delegado nem o escrivão haviam comparecido naquele dia (não foi dado motivo algum pra tanto) e que ninguém poderia tomar o depoimento arrasou o marido dela. Pra piorar, quando disse que sabia onde o tal garoto morava e pediu aos policiais que fossem com ele até lá, recebeu a seguinte resposta: “Pô, sério que você vai querer que a gente saia em um sol desses por causa de uma bobagem?”

      1. JJota

        Estou falando de um município de vinte mil habitantes. Imagine na capital…

    1. Gustavo Audi

      Um amigo meu foi roubado em frente ao Maracanã pouco depois da “grande abertura”.
      Na delegacia, não conseguiu prestar queixa porque só tinha um policial atendendo. Palmas para nossos serviços.
      Nós carecemos de elementos básicos de uma sociedade, como segurança, saúde e educação (principalmente este). E ainda pagamos caro por esta ausência…

      1. JJota

        Por isso achei o seu texto fantástico! A grande verdade é que somos um povo acostumado a ser manipulado de todas as formas. Apoiamos iniciativas ridículas como gastos exorbitantes para uma Copa porque nos fazem crer que isso trará benefícios ao país (como se manter elefantes brancos não fosse, pelo contrário, trazer mais gastos), mas nem o antigo metrô de Fortaleza (creio que está em construção há uns quinze anos!) será entregue. Aeroporto? Estradas? Ampliação de hospitais? Piada, né?

        Ao mesmo tempo, logo temos a tendência a nos solidarizar com qualquer categoria que entra em greve, pois eles estão “lutando pelos seus direitos”. Nos esquecemos que eles pisam em nossos direitos como cidadãos, nos atendendo mal, desrespeitando prazos, “furando” procedimentos… Mas quando entram em greve conclamam (digo mais: EXIGEM!) o apoio popular.

        E adoramos ser feitos de tolos, não? Adoramos que vendam a nossa imagem como a de pessoas simpáticas e alegres. Na verdade, somos mesquinhos, preconceituosos, acomodados. Usamos o descaso das autoridades como desculpa pra tudo (“Vai estudar, não?” “Pra quê? O ensino público é ruim…”).

        1. Bela inversão de raciocínio, Jotinha! O que vc acabou de escrever me lembrou uma polêmica lá dos anos 1930 que ainda se perpetua até hoje, mas que, infelizmente, é calada por todos os produtores de conhecimento desse país.

          1. JJota

            São tantas polêmicas varridas pra debaixo do tapete? De qual você está falando? Crise do café? Estado Novo?

          2. Dr. Housyemberg Amorim

            Uma entre o Sérgio Buarque de Hollanda e Gilberto Freyre sobre como a cordialidade (cuja versão nova se chama respeito, a base do politicamente correto) define o brasileiro…

          3. JJota

            São aquelas bobagens que tentam vender aos outros e, por incrível que pareça, convencem mais a nós mesmos (na boa, a imagem que passam pros outros é que somos simplórios): tolerantes, alegres, “não desistimos nunca”, etc.

            Não gosto de algumas coisas que ele escreve, mas acho que o texto do Arnaldo Jabor (Brasileiro é um Povo Solidário? Mentira!) é simplesmente fantástico.

          4. Dr. Housyemberg Amorim

            Aí vc está falando somente do Freyre. A posição do Sérgio Buarque é muito, mas muito diferente… Agora, o Arnaldo Jabor, de vez em quando, acerta… E esse negócio de “não desistir nunca” é algo bem mais recente do que a época a que me referi…

          5. JJota

            Eu estou falando no geral e trazendo pros dias de hoje. Mas o brasileiro sempre adorou ser paparicado como “povo lindo”, “país tropical”, essas bobagens…

          6. Dr. Housyemberg Amorim

            Agradeça aos cults musicais – Jorge Ben, Chico Buarque (em várias músicas), Gilberto Gil, Caetano Veloso que praticamente pavimentaram essa visão em sua produção pós-ditadura… Isso, em alguma medida, recebeu uma enorme atenção da mídia, principalmente pelo marketing nos últimos 30 anos…

            É triste, mas é verdade.

  2. toddy

    ótimo texto cara, nos tempos de hoje começar um país do zero, significa começar uma nova era na política do país, é ai que está o problema maior do Brasil, isso jamais vai acontecer aqui, os dinossauros político vão estar sempre lá e depois seus filhos e netos, é um círculo vicioso que ainda vai durar por muitas gerações

    1. Gustavo Audi

      Apesar de não ser deslumbrado com a tecnologia, acredito que o acesso à informação através da internet (cada vez mais popular) pode, no futuro, impactar nesse paradigma de “é a minha vez de me dar bem” ou “ninguém está vendo”.
      A maior parte dos brasileiros ainda está refém de uma mídia escrota e de bens culturais muito caros. Mas sou otimista neste caso: os preços caem e o uso aumenta. Com isso, a porra do moleque, que acha que para ter um bom futuro ou deverá ser traficante ou jogador de futebol/pagodeiro, terá novas perspectivas e, junto a elas, uma nova interpretação do que é ser cidadão.
      Mas, de fato, um bom começo seria excluir permanentemente essa raça maldita de pessoas criadas ainda com espírito colonial…

  3. Mc jhowohip-hop

    HUMILDADE ACIMA DE TUDO APROVEITE BEM A VIDA JUNTO COM SE AMA PORQUE A VIDA É CURTA

        1. Don Vittor

          Tá a fim de dar a bundinha? Aqui tem uns correria que curte furar.

    1. Don Vittor

      O bagulho é só número primo e outros são múltiplos de 3. Enquanto vocês liam, levei a carteira de vocês.

  4. Mc jhowostentação

    Sandra Mel ka de vc manda um oi pramim aeeeeeeeeee

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