As condições de Gauss de nossas vidas

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Ignorar a resistência do ar. Desprezar a massa do fio de um pêndulo. Arredondar a aceleração da gravidade para 10 m/s². Basta alguns minutos de estudo sobre física para começar essas convenções. Elas servem para tornar prático e um tanto mais simples alguns cálculos e o entendimento geral de alguns itens. E quando nos damos conta, percebemos que estas situações idealizadas estão em todo lugar, sendo talvez até estranho não pensar desse jeito.

Se você leu o título deste texto e acha que vou tratar do estudo de espelhos esféricos ou da diferença de velocidade de raios luminosos em certas superfícies, esqueça. Se você sequer sabe que as condições de Gauss são parte do estudo da óptica, tudo bem também. Afinal, como destacado acima, vim falar de situações ideais, de como elas podem nos afastar da realidade e de como isso tudo me afetou no trabalho e nos estudos nesses últimos tempos.

Afinal, que situações são essas?

Qual o melhor jeito de estudar? Você malha do jeito certo? Você é o melhor ser humano que consegue ser? Garanto que se você nunca fez essas perguntas a internet já as fez por você. E talvez, como eu, você começou a se colocar em xeque: estou fazendo errado? Estou deixando coisas importantes de lado?

É nessa hora que você estabelece seu patamar de seus novos objetivos. Mais ainda, o altar de como as coisas devem ser para você, tamanha a lapidação dos processos, rotinas e técnicas que devem ser empregadas na sua vida.

Cabe aqui um adendo: Não estou reclamando de pessoas que querem otimizar rotinas ou buscam algum tipo de evolução profissional, pessoal e/ou mental. Mas essa cruzada pela perfeição contempla o fato de você ser humano? Contempla suas variações de humor, desânimos, emprego e toda a bagagem do estresse urbano?

Espero que sim, porque eu não dei a devida atenção a esse aspecto humano. O resultado foi frustração atrás de frustração, seguido por uma sensação de incapacidade e estagnação e um replanejamento – ainda mais polido e inverossímil – da minha vida.

Permita-me a ilustração de um exemplo.

Estou com reformas em casa, estudo em uma faculdade a distância e faço hora extra no trabalho. Em busca de um aprendizado mais eficiente elaborei novas estratégias, mas precisava de local adequado e organizado., ou seja, precisava acelerar a reforma. Isso demanda tempo, que eu não tinha por conta das tarefas da faculdade e dos horários de trabalho. Isso sem falar que se eu pensar em preparar aulas em casa, não estudo. Percebem as cordas apertarem os nós da trama? Pois, é, isso sem nem adicionar as variáveis de viver, como ver uma série ou filme. Faz 6 meses que não jogo RPG e nunca fiquei tanto tempo assim parado em mais de 15 anos de hobby…

Já se sentiu tão engolido pelo que tinha de fazer que não conseguia pensar direito?

Esse é o problema de idealizar tudo de forma perfeita. Quando a realidade destoa, nos sentimos angustiados.

Quando tentamos perdoar alguém e não conseguimos, nos sentimos mal porque um ser humano exímio o faria.

Quando tentamos dar o melhor de nós no trabalho e não conseguimos, nos sentimos frustrados porque um trabalhador modelo o faria.

Quando temos que fazer algo, mas a rotina do dia nos trouxe cansaço e desânimo, nos sentimos mal porque achamos que estamos fazendo corpo mole.

Por isso é bom perceber a realidade que temos em nossas vidas. Se 10 minutos de estudo é o que temos num dia, não podemos deixar de tê-lo só por não ser a técnica mais recomendada para isso. É nossa realidade naquele momento.

O mesmo vale para nossa paciência ou para nosso temperamento. Não conseguimos ser um poço de paz e tranquilidade o tempo todo. Mas está tudo bem, mesmo não sendo nossa situação idealizada.

Concluindo, passamos boa parte da vida em busca dos pais perfeitos, das rotinas de estudo perfeitas, da produtividade perfeita. Mas temos que lembrar que ao invés de procurar um espelho esférico, podemos muito bem ver as gotas de chuva atuarem como prismas e aproveitar o arco-íris no final da chuva.

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