Afinal, quadrinhos são ou não Panfletários?

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O mimimi das redes sociais é garantido. Somos (quase) todos liberais e aceitamos o novo mundo de braços abertos. Nunca falamos tanto dos opressores de nossos ideais quanto agora. Vamos pra rua e soltamos o verbo na internet. Não nós, claro… jovens cheios de opinião e alguns adultos que tentando ser pertinentes falam mais do que deveriam. Será? Tudo é política?  Até nos quadrinhos?

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Os mais velhos reclamam e lembram de tempos mais puros em que os quadrinhos eram pra crianças e que ninguém discutia política abertamente. Jura? E o “Espanque um Japa”? E a famosa capa do Capitão América em que o herói patriota espancava o mais famoso dos nazistas? E o que dizer daqueles  vilões comunistas dos primórdios do Homem de Ferro? O que acontece nos tempos de guerra fica nos tempos de guerra? Tem certeza de que criar heróis só para combater o eixo, comunistas, vietcongues ou chineses não é panfletário nem “mimimi” só porque é entretenimento infantil?

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Não se enganem. Os quadrinhos sempre foram políticos. Nos EUA  dizem que a DC é Republicana e a Marvel Democrata.  Enquanto a primeira (até certo ponto) defendeu os velhos valores e ofereceu ícones da postura correta, dos bons costumes e do modo de vida Americano, a Marvel apresentou os dilemas, valores e principalmente os defeitos do cidadão comum. Seus heróis sempre viveram numa linha cinzenta, e por milímetros sua moral poderia ter pendido para o lado errado.  Histórias sobre drogas, criticas presidenciais veladas, racismo e outros elementos que provaram que independente da crença política do escritor, as histórias tinham o tom da casa. Um dos grandes exemplos foi a campanha de Howard, o Pato pra Presidente. O evento sátira que fez com que um personagem de quadrinhos concorresse com Jimmy Carter em 1976.  A DC não ficou atrás e perto dos anos 1980 fez com que Oliver Queen concorresse a prefeito de sua cidade fictícia. E não podemos esquecer de citar As Sagas da Coroa da Serpente e da Petróleo Roxxon/Rocha Lunar em que o Presidente dos Estados Unidos era um corrupto de direita que praticava diferentes tipos de ilegalidade. Nos dois casos, analogias à Nixon e seu Watergate.

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A DC, sempre atrasada, só foi criticar presidentes a partir de 1986, quando Ronald Reagan apareceu no Cavaleiro das Trevas de Frank Miller. A partir de 1987, o que antes era um caso isolado, passou a ser lugar comum nos títulos da editora. Ronald Reagan, Oliver North, Rússia e a Guerra Fria viraram temas de vários títulos da editora entre 1987 e 1990. Os personagens foram globalizados e passaram não só a refletir o mundo real como a utilizar cidades e personagens em evidência. Durante uma saga da editora em que seus heróis precisavam proteger uma invasão mundial, até Fidel Castro ganhou uma versão em quadrinhos. E de forma velada ou direta, a política interna e externa se tornaram presença importante nos quadrinhos. Durante o evento Cisma dos X-Men, sobrou até para o presidente Iraniano Mahmoud Ahmadinejad, cujo discurso infeliz sobre não haver homossexuais em seu país e que se houvessem eles seriam exterminados foi adaptado para uma crítica aos mutantes rebatida por Kitty Pryde, que além de mutante também representa o povo Judeu, antagonista ideológico natural daquele país.

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O grande Boom entretanto, foi Barack Obama. O candidato que acabou se tornando o primeiro presidente negro dos EUA sempre foi o queridinho da mídia liberal e chegou a ser citado pela comediante Tina Fey, que assumiu suas intenções de voto durante o programa 30 Rock.  Nos quadrinhos ele foi de tudo; conselheiro, super-herói e até ídolo do Homem-Aranha. Pela primeira vez na história todos demonstravam simpatia a um democrata e declaravam isso em suas mídias. Até a DC fez isso em alguns momentos. O presidente popstar foi eleito e ainda mais incensado. Diferente de seus valores, as críticas ao seu governo não ganharem uma única linha de roteiro. Na contramão disso tudo está o Republicano Donald Trump. Ninguém gosta de suas declarações e muitos o comparam a um nazista que pretende erradicar toda a diversidade pela qual os mmizentos do Facebook tanto lutam. Como a mídia não perdoa, ele já foi retratado de todas as formas ruins possíveis. A Marvel Já o colocou como uma versão do M.O.D.O.K., a DC o colocou como pai de uma vilã da Arlequinha… e só estamos citando alguns exemplos. Sabemos que votar é opcional nos EUA, mas muitos leitores optam por exercer esse direito e votarão em Hillary Clinton porque a mídia, principalmente os quadrinhos, pregam que eles devem combater o mal.  Intencionalmente, os quadrinhos estão destruindo a carreira de Trump na mesma intensidade que construíram a de Obama. Ele é um monstro, um vilão que quer segregar o país e que deve ser combatido para que os EUA não virem uma nova Alemanha nazista.

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No Brasil temos uma abordagem sarcástica e debochada, o que pode ser visto em textos de periódicos como O Pasquim, Bundas, Casseta Popular e Planeta Diário. Sátira política foi parte integrante de nossa cultura, principalmente entre  as décadas de 1960 e 1980, quando ainda sentíamos as vantagens e desvantagens de viver numa caserna, uma época em que o Facebook não vingaria e que os mais empolgados não durariam além da primeira reclamação do governo e o silenciamento desses descontentes faria com que muitos acreditassem viver em tempos de paz.  Valendo-se da recém adquirida e extremamente mal-usada liberdade de expressão todos falam mais do que devem e  qualquer pérola de inteligências raras como Jair Bolsonaro vira meme ou flame. O que os quadrinhos americanos fazem de forma inteligente, os pseudo-intelectuais supostamente politizados das mídias sociais brasileiras transformaram em ofensas gratuitas e desrespeito, mesmo que o criticado esteja completamente errado em suas colocações. Felizmente, temos expoentes isentos do humor inteligente como o chargista Maurício Ricardo e os responsáveis pela animação Rái Sossaith, que mantém o bom humor ao satirizar não só o Bolsomito como todos os outros personagens polêmicos da mídia.  Na animação, o fã do Coronel Ulstra mostra para o apresentador o prazer de se polir um fuzil.

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Assim é em cima como é embaixo”. Exemplos não faltam, mas o espaço é pequeno, o que nos obriga a ser sucintos. A verdade é que a mídia destrói e cria tudo aquilo com a qual concorda ou discorda.  Desde a época dos bobos da corte e dois menestréis o mundo tem visto a nudez de seus reis e desde que a república foi instaurada, as críticas bem inseridas no inconsciente coletivo tem sido a ruina de todas as cabeças coroadas. Algumas inteligentes, outras nem tanto, mas a verdade é que todos têm seu espaço, menos os de direita, esses nascem, crescem e morrem com um alvo no peito.

A história se repete e os quadrinhos continuam tão panfletários quanto sempre foram.

The Sumpa

The Sumpa é um dos muitos disfarces de Alexandre D'Asssumpção. Roteirista, redator e professor de roteiro, The Sumpa é uma lenda urbana, um sujeito que muitos dizem já ter avistado, mas nenhum dos relatos parece falar da mesma pessoa.

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